“Certa manhã acordei de sonhos intranquilos” e o debut da metamorfose de Otto

Foto: Ananda Zambi

E até pra morrer você tem que existir”. O verso da música “6 minutos”, de Otto, pode resumir o tom do disco Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos (2009), um dos grandes clássicos do artista pernambucano. O álbum está completando 15 anos neste ano e a turnê de comemoração pousou na última quinta-feira (7/11) no bar Opinião, em Porto Alegre. Inspirado no livro A Metamorfose, de Franz Kafka, Certa Manhã… foi produzido em um momento difícil da vida de Otto, ao lidar com a morte da mãe, ao se separar de sua ex-esposa, Alessandra Negrini, e o rompimento com a gravadora Trama. Mas a nova turnê não é um culto ao sofrimento, pelo contrário: é um incentivo e um testemunho do poder da transformação.

Com a casa de shows nem muito cheia nem muito vazia, a apresentação iniciou por volta das 23h com a música que abre o disco, “Crua”, seguido de “Janaína” e “Meu Mundo”, parceria com Lirinha, ex-vocalista do Cordel do Fogo Encantado. Um apaixonado confesso pelo Rio Grande do Sul, Otto fez uma pausa nas músicas e parabenizou os gaúchos pela recuperação do estado após as enchentes.

Após, foi a vez de “Filha”, um dos momentos mais catárticos  e bonitos do show, pois ao redor via-se que, ao cantar o refrão (Aqui é festa, amor / e há tristeza em minha vida), muitos estavam tentando exorcizar as suas dores mais profundas naquele momento que se propõe a ser alegre. A seguir, veio “6 minutos”, citada no início, uma das piores dores de cotovelo que já ouvi na vida. Musicão. Pedrada.

Depois, foi a vez de Lavínia entrar em cena. Atriz e cantora, a namorada de Otto tem acompanhado o músico na turnê para cantar as parcerias femininas do disco, como “O Leite” (originalmente gravada com a Céu), “Lágrimas Negras” (versão de Jorge Mautner e Nelson Jacobina) e “Saudade”, as duas últimas tendo parceria com a cantora mexicana Julieta Venegas. Esse momento do show ressalta o fascínio de Otto por vozes femininas, que desde sempre estão presentes na sua obra.

Otto também cantou suas versões de músicas populares, como “Naquela Mesa” (Sergio Bittencourt) e “Em Plena Lua de Mel” (Reginaldo Rossi). Em entrevista, o cantor explica que gosta de regravar clássicos como uma forma de apresentar para as novas gerações.

Após tocar o Certa Manhã… na íntegra e já se encaminhando pro final, foi hora de ouvirmos alguns outros sucessos de Otto, como “Bob”, “TV a Cabo”, “Dias de Janeiro”, “Carinhosa” e “Low”. Pra encerrar, o artista emendou “Cuba” com duas músicas de Chico Science e Nação Zumbi (banda da qual ele já fez parte): “Da Lama ao Caos” e “A Praieira”, terminando o espetáculo com uma grande e esfuziante rodinha na plateia.

Shows são sempre um momento livre para haver uma comunhão entre artista e público, e nem sempre isso acontece. Mas nesta noite aconteceu, e de uma maneira especial. Durante o show, Otto contou que a primeira vez que tocou no Opinião foi com a banda Mundo Livre S/A, e disse: “Eu era tão feliz lá, e sou tão feliz agora. Mas é diferente”. É uma prova de que sempre haverá tempestades e arco-íris em nossas vidas, mas que também vamos é possível nos metamorfosear e superar as adversidades.

Ouça Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos: