Me incomoda a manifestação de orgulho da ignorância. Lembro quando morreu o cantor Cristiano Araújo. Era conhecido por milhões de pessoas. Outros tantos milhões, incluindo eu, não o conheciam. Não sou exatamente um fã de música sertaneja. Mas não posso sentir orgulho de não conhecer alguém. E não faltaram aqueles que fizeram questão de dizer que não sabiam quem era. Outro dia, vi um influenciador reagindo a um coach mirim. O pequeno questionava a razão de aprender sobre Aristóteles, dizia que não tinha utilidade. Fazia o mesmo discurso sobre a Segunda Guerra. Da mesma maneira que alguns manifestam orgulho de não conhecer algo, também me parece mais frequente este raciocínio utilitarista sobre o conhecimento.
Confesso que hoje tive uma pequena crise existencial com isso. Resolvi estudar e trabalhar com Jornalismo por acreditar que a informação é uma ferramenta importante de transformação e que tendo conhecimento, as pessoas podem fazer escolhas melhores e corrigir situações em desalinho. No entanto, resolvi tensionar esta minha lógica. E se eu fizer coro a quem diz que a Terra é plana? Na prática, que diferença faz? Alguém de fato é mais feliz por ter conhecimento ou a ignorância é realmente uma benção?
Não quero ser pretensioso aqui e trazer um emblasto capaz de aliviar a melancolia. Apenas, utilizo este espaço para compartilhar alguns questionamentos e pensamentos que tive.
O Restaurante no Fim do Universo é o segundo livro da série do Guia do Mochileiro das Galaxias. No texto, somos apresentados ao planeta florestal Oglaroon, que tem toda a sua população inteligente vivendo no interior de uma árvore. “Dentro de tal árvore nascem, vivem, apaixonam-se, entalham em sua casca minúsculos artigos especulando sobre o sentido da vida, a futilidade da morte e a importância do controle de natalidade, combatem em algumas guerras de pequena importância, e eventualmente morrem pendurados sob as ramagens de alguns dos galhos exteriores mais inacessíveis”. Eles são felizes, ignorando toda a vastidão do universo.
Na mesma obra, também conhecemos oVórtice de Perspectiva Total, considerado “a mais selvagem das torturas psíquicas a que se pode submeter um ser consciente”. Mas o que poderia ser tão terrível? O livro explica: “quando você é posto no Vórtice você tem um vislumbre momentâneo de toda a inimaginável infinidade da criação, e em algum lugar, um marcador minúsculo, um ponto microscópico sobre um ponto microscópico, dizendo “Você está aqui”.
A ignorância do povo de Oglaroon é contraposta à dilacerante angústia do conhecimento sobre o tamanho do Universo e, por consequência, à insignificância do ser. Ok, deixando Douglas Adams de lado, o que me questionei foi o quanto a ignorância não é capaz de tornar alguém mais feliz? O quanto a busca pelo conhecimento não é, na verdade, um exercício de autoflagelo? Se Winston Smith não se preocupasse em conhecer a Irmandade, ele teria uma vida medíocre, porém tranquila e, talvez até feliz, acreditando no Grande Irmão?
Casualmente, foi em Aristóteles, filósofo execrado no início deste diálogo, por um influenciador ainda criança quem trouxe as primeiras respostas que encontrei e me mostrou que este questionamento pode carregar uma armadilha. Para o grego, a felicidade está diretamente ligada à busca pelo conhecimento. Ele compreendia que a verdadeira felicidade não estava apenas em sentir prazer, mas na vivência de acordo com a virtude e a razão.
Considerando que os humanos são seres racionais, usar a razão e buscar o conhecimento são ações essenciais para entender o mundo e compreender a si mesmo, de modo a tomar decisões mais sábias.
Outra pessoa que se propôs a discutir a felicidade foi o fundador do Movimento Escoteiro, Baden-Powell. “O melhor meio para alcançar a felicidade é contribuir para a felicidade dos outros”. Unindo os dois pensamento, confesso que senti um pouco da dúvida se dissipando. Se a felicidade está ligada à busca pelo conhecimento e também à contribuição para a felicidade alheia, faz total sentido seguir lutando para a disseminação da informação.
Faz todo o sentido a batalha, aparentemente ingrata, travada pelos professores, que comemoram seu dia ontem, para construir o conhecimento, mesmo tendo que desmentir bobagens jogadas às toneladas na cara de todos. Aos meus amigos, ainda que atrasado, fica o meu abraço pelo Dia do Professor.